Modelo

[Modelo] Trancamento de Inquérito – Policial Promotor de Justiça

Habeas Corpus

HABEAS CORPUS – TRANCAMENTO DE INQUÉRITO POLICIAL – PROMOTOR DE JUSTIÇA – REALIZOU E PRESIDIU INQUÉRITO

EXMO. SR. DR. DESEMBARGADOR DA COLENDA ___ CÂMARA CRIMINAL DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE ____.

“A prova ilícita contraria o processo, o inquérito policial, o processo administrativo e a sindicância. A legalidade pode e deve ser analisada a qualquer momento.”(STJ – HC nº 6.008 – SC – DJU 23.06.97, Min. LUIZ VICENTE CERNICCHIARO)

___________________________, brasileiro, solteiro, Advogado, inscrito na OAB/____, sob o n.º ______________, o qual labora na ___________________, com sede na Rua _________________ n.º ________, Bairro _____________, na cidade de ______________, vem, com todo acatamento e respeito à presença de Vossa Excelência, tendo por fulcro e ancoradouro jurídico, o artigo 5º, LXVIII, da Constituição Federal, e artigos 647, e seguintes, do Código de Processo Penal, interpor a presente ação penal constitucional de HABEAS CORPUS

em favor do paciente (nome, qualificação e endereço), figurando no polo passivo, como autoridade o nobre Promotor de Justiça desta Comarca de ____, que realizou e presidiu a instauração de inquérito policial contra o paciente, que ora tramita sob nº ____ (doc. 2), ao qual falta o requisito licitude, afrontando diretamente o artigo 157 do CPP.

O objeto deste WRIT é obter ordem judiciária determinando à ilustre autoridade policial titular do __º Distrito Policial desta Comarca que pare as investigações tendo por objeto o inquérito policial sob n° ___ em que figura como indiciado o ora paciente.

É de conhecimento público e notório que o conspícuo membro do Ministério Público da comarca de ___, está presidindo e realizando as investigações relacionadas ao possível cometimento de crime de ___, onde o paciente é principal suspeito.

Em verdade o Ministério Público é o titular da ação penal pública, id est, consoante o dispositivo constitucional (cf. artigo 129, I da CF) é função institucional do Ministério Público promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei, como é, também, cristalino e indiscutível que as investigações no âmbito penal são tarefa dos órgãos definidos no art. 144, § 1º, I, IV e § 4º da Carta Política, sendo assim, deve o Parquet apenas requisitar às autoridades policiais a apuração dos ilícitos penais, com a instauração do competente inquérito, e não realizar investigações ao arrepio da lei.

Causa espécie a atuação do MP, onde realiza investigações, participa de diligências, etc. um verdadeiro abuso ilegal, nas palavras de Luiz Flávio Gomes, comentando o artigo 157 do CPP:

“Não importa, como se vê, se a norma violada é constitucional, ou internacional, ou legal, se material ou processual: caso venha a prova a ser obtida em violação a qualquer uma dessas normas, não há como deixar de concluir pela sua ilicitude (que conduz, automaticamente, ao sistema da inadmissibilidade)”.

GOMES, Luiz Flávio (Org.). A prova no processo penal (comentários à Lei nº 11.690-2008). – São Paulo : Editora Premier Máxima, 2008, p. 37.

Da leitura atenta do Diploma Processual, temos algumas constatações muito simples: a uma diz a letra da lei que pode o Ministério Público requisitar a instauração do inquérito, mas não diz em momento algum que pode o próprio Parquet instaurar e presidir a investigação. Se há a distinção e o distanciamento legal, há de ser observado pelos integrantes do Ministério Público; a duas, o inquérito policial não é imprescindível ao oferecimento da denúncia, tanto que o art. 12 do CPP é bem claro sustentando que “sempre que servir”; haverá casos em que não irá servir como base da denúncia ou queixa, ou seja, não será indispensável; a três, as novas investigações e diligências, após o arquivamento do inquérito policial, poderão ser feitas apenas pela autoridade policial, em conformidade com o art. 18 do CPP, demonstrando, o quanto basta, a titularidade para conduzir o procedimento investigatório penal; a quatro, o art. 27 que trata da provocação do Ministério Público versa com clareza solar sobre a possibilidade de apresentação de denúncia ou requisição de instauração de inquérito e não condução da investigação; a cinco, se o Ministério Público requerer e depois requisitar o arquivamento do inquérito, por meio de seu promotor ou Procurador Geral, significa afirmar que não pode ele mesmo arquivar, porque não tem atribuição para conduzi-lo. (cf. artigos 5º, 12, 16, 17, 18, 27 e 28 do CPP).

A jurisprudência dos tribunais pátrios já se consolidou no entendimento acima esposado, vejamos:

MINISTÉRIO PÚBLICO – PROPOSITURA DE AÇÃO CRIMINAL – LASTRO EM INQUÉRITO ADMINISTRATIVO – ATIVIDADE RESERVADA À POLÍCIA JUDICIÁRIA – USURPAÇÃO DE FUNÇÃO – DENÚNCIA REJEITADA. Lastreando a denúncia em inquérito ou investigação administrativa, que possui a natureza de inquérito policial, levada a cabo pelo próprio órgão ministerial, a sua ilegitimidade para o procedimento deflui de normas constitucionais e da própria Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, não legitimando, por consequência, a propositura da ação criminal. Rejeição da denúncia que se impõe. (Processo Crime de Competência Originária nº 1.0000.07.455822-2/000(1), 3ª Câmara Criminal do TJMG, Rel. Antônio Carlos Cruvinel. j. 25.11.2008, maioria, Publ. 20.02.2009).

Trazemos também o excerto de voto vencedor do HC 993.08.042790-9, voto este que pela clareza e percuciência dino de nota:

Habeas corpus. Investigação direta pelo Ministério Público em paralelo a inquérito policial existente. Impossibilidade.

Pedro Gagliardi

2º juiz – voto vencedor

Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – 15ª C.

HC 993.08.042790-9

Voto nº 17.723

  1. 19.12.2008

Voto

“De início já se vê que o tema aqui debatido é hoje um dos mais importantes, em face da criminalidade crescente em nosso país e da precária resposta que os órgãos oficiais vêm apresentando para proteger os cidadãos. Vejamos.

Colocou-se o Ministério Público mais próximo da segurança pública e a criminalidade organizada aumentou. Colocou-se o Exército na rua, para tomar conta de favelas, e a criminalidade aumentou. Os políticos passaram a dar as determinações no modo de atuação da Polícia, e a criminalidade aumentou. Basta! Está na hora de repensarmos essas atitudes que se mostraram desastrosas. Talvez seja a oportunidade para devolver a atuação policial aos profissionais do ramo (…).

Ora, se até para desaforar o julgamento de um feito para outro Juízo com mesmo poder jurisdicional existe um procedimento legalmente previsto, como não exigi-lo no caso de deslocamento de atribuição de um órgão – polícia judiciária – para outro – Ministério Público?” (…)

Ademais, mesmo quando reconhecida a possibilidade desse exercício atípico pela promotoria, para que se possa atribuir algum valor probatório ao resultado da investigação Ministerial, devem-se respeitar todos os princípios do processo penal atinentes à prova. E preciso que se observem regras processuais tais como: 1- a realização de perícias deve ser levada a cabo por órgãos oficiais, e quando não, deve sua impossibilidade ser justificada; 2- a colheita de testemunhos deve se cercar das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa; 3- deve-se respeitar a publicidade dos atos praticados. Nem se alegue tratar-se de simples procedimento investigatório e, por isso, serem dispensados o contraditório e a ampla defesa, próprios da ação penal, uma vez que o Ministério Público é parte e, portanto, contaminaria de suspeição a prova colhida de forma unilateral, dado que parcial. A contrario sensu, imaginem a parte, ou melhor, a defesa, chamar para si a colheita da prova indiciaria, convocar ao escritório do defensor testemunhas e reduzir seus depoimentos a termo, providenciar a elaboração de perícias e, ao final, encaminhar as peças a Juízo a conclusão do feito e pedir a instauração de ação penal. Tal atividade seria tida como absurda e desprovida de seriedade jurídica, mas não se afasta em muito daquela adotada pela acusação e estaria em consonância como princípio da paridade de armas entre as partes. Assim, facultar ao Ministério Público produzir provas pessoalmente e sem qualquer controle, peças estas que servirão de base para o oferecimento de denúncia ou para o pedido de arquivamento, causaria sério risco ao princípio da paridade de armas. Verifica-se que não somente devem ser estabelecidas as hipóteses legais permissivas da atividade investigatória exercida diretamente pelo representante do parquet, como, também, a forma como ela deva ser conduzida, em respeito aos direitos e garantias individuais previstos na Constituição Federal, para com isso serem preservados os direitos e garantias individuais. Lembre-se que o artigo 5º, da Constituição Federal, estabelece: I- em seu inciso XXXVIII, a proibição da criação de juízo ou tribunal de exceção; II- no inciso LIII, que ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente; III- no inciso LIV, o devido processo legal; IV- no inciso LV, o contraditório e a ampla defesa; V- no inciso LVI, a inadmissibilidade da prova obtida por meio ilícito; VI- no inciso LX, a publicidade dos atos processuais. Mas não é só. (…)

Ao avocar para si a investigação criminal, assume o representante do parquet que se encontra em posição mais favorável e imparcial à apuração dos fatos. Assim sendo, ao pinçar provas e excluir da apreciação da autoridade judiciária aquelas que entende desfavoráveis a formação da culpa do averiguado, afronta o princípio da busca da verdade real. Nem se diga que eventual irregularidade na coleta de prova na fase inquisitorial não inquinaria de vício a ação penal, posto que tal posicionamento só se aplica no caso de inquérito policial presidido pelo delegado de Polícia, autoridade imparcial e dotada de fé pública, enquanto que o procedimento conduzido pela Promotoria, ao contrário, possui a característica da parcialidade e eventuais eivas potencializam esta tendência e viciam a peça acusatória, consequentemente seu recebimento. (…)

São duas as características do sistema acusatório: iniciativa do processo atribuída a sujeito distinto do órgão julgador e divisão entre as funções de acusar, defender e julgar. O Ministério Público subverte o sistema acusatório ao investigar ilícitos penais de forma desregrada, diretamente. Com isso causa desigualdade entre as partes e fere o princípio do devido processo legal, em afronta ao disposto no artigo 5º, caput, e incisos LIV e LVI, da Constituição Federal. Verifica-se a violação a direitos e garantias fundamentais e, portanto, dela decorre nulidade absoluta. (…)

Nem seria preciso ressaltar, mas é bom que se o faça para evitar maledicências, que o Ministério Público é uma instituição que merece todo o nosso respeito e admiração. Seria tresloucada sandice divergirmos de uma instituição que é perfeita nos seus propósitos. Todavia podemos discordar da atuação e interpretação que dela fazem alguns de seus membros, mesmo porque onde entra o fator humano, as coisas se complicam. Pois bem. Prestada essa devida e merecida homenagem institucional, prossigamos em nosso texto. (…)

Forçoso concluir que o órgão acusador pertencente ao Ministério Público, com garantias constitucionais, pode obter a prova que entender necessária, para a formação de sua opinio delicti, tendo para si todo o aparelhamento estatal.

Todavia, o titular da ação privada, representado em juízo pelo advogado, não dispõe do poder de requisição nem de garantias constitucionais. Depende, para a colheita de provas, da autoridade policial, que, por sua vez, se vale do inquérito policial. Ora, para algumas infrações penais é perfeitamente dispensável o inquérito, assim como, consoante a Lei 9.099/95, dispensável é também a ação penal.

Entretanto, para se propor ação penal, é necessário se tenha a “fumaça do bom direito”. Só assim poderá o juiz receber a denúncia ou a queixa-crime, submetendo o réu ou querelado aos dissabores da ação penal, aos aborrecimentos que a lide penal provoca ao acusado, mormente naqueles casos em que é absolvido, por ser inocente. Por tais razões a ação penal deve estar fundamentada em provas colhidas pelos órgãos que a Constituição Federal de 1988 designa, mormente no art. 144, § 4º, que determina sejam as infrações penais apuradas pelas “Polícias Civis, dirigidas por delegados de Polícia de carreira”. (…) Parece-me que seja mais prudente cada profissional permanecer na sua especialidade. “Lé com lé, cré com cré”, diziam os medievais. Ou, modernamente, eufemizando o texto, proclamamos em francês: “chaque songe dans sa branche”, que um velho tabaréu me traduziu em português fluente, como “cada macaco no seu galho”.

Pedro Gagliardi

2º juiz – voto vencedor

Cristalino que o Ministério Público subverte o sistema acusatório ao investigar ilícitos penais diretamente.

Por tudo, pede-se e espera-se que esta ordem seja concedida, requisitadas as informações da autoridade coatora, seguindo-se o trancamento do inquérito policial sob n° __ que tramita perante a __º Delegacia de Polícia desta Cidade de ___, cumpridas as necessárias formalidades legais.

_________________________, em ____ de _____________ de 2.00__.

________________________

OAB/_____________.

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    Escrito por:
    Cláudio Farenzena
    Advogado especialista em Direito Ambiental pela UFPR, pós-graduando em Direito Penal e Processual Penal e idealizador do AdvLabs.
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