Modelo

Modelo Ação Civil Pública – Contra Desmatamento Indiscriminado

Ação civil pública

Inicial de ação civil pública contra acusado de extração indiscriminada de madeira, para suspensão das atividades e condenação à recuperação da área desmatada.

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA _____ª VARA DA COMARCA DE MARACAJU-MS

AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEdido de LIMINAR

em face de ANTONIO GOMES DA SILVA FILHO, brasileiro, casado, agricultor, portador da CI-RG n. 88883/SSP/MT, filho de Antonio Gomes da Silva e Antonia Olinda da Silva, nascido aos 2016.02.56, em Araripe-CE, com endereço na Rua Rainha dos Apóstolos, 851, em Vicentina-MS, Comarca de Fátima do Sul-MS, pelos motivos de fato e fundamentos de Direito que seguem:

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I – Da providência administrativa preparatória à propositura da ação cívil pública

Instaurou o Ministério Público Estadual o Inquérito Civil n. 006/2016 – cujo original instrui este pedido – após constatar, através do Auto de Infração IBAMA n. 038380, a degradação ambiental provocada pelo Réu, consistente em desmatar e armazenar produto vegetal na Fazenda Nossa Senhora Aparecida que, como adiante se demonstrará, foi realizada com infração às disposições constitucionais e infraconstitucionais atinentes ao ambiente.

Através de notificações e requisições se perquiriu, amiúde, a dinâmica da atividade objeto da investigação, colhendo detalhes suficientes da atividade danosa ao ambiente, merecendo atenção especial a importância da Serra de Maracaju no cenário ambiental deste Estado, conforme ressaltado no Relatório de Vistoria confeccionado por Engenheiro Agrônomo que prestava serviços ao Autor (f. 73/80).

Com as requisições legais em busca de subsídios fáticos sobre a atividade degradante desenvolvida pelo Réu, foram desvendados aspectos interessantes e que emprestam a este pedido um caráter de preponderância sobre os interesses individuais do agente poluidor.

O Auto de Infração IBAMA n. 038380, de 20.05.000000, lavrado pela Polícia Militar Ambiental, aponta no campo “Descrição da Infração” (sic – f. 08):

“Extrair produto florestal (aroeira) sem plano de manejo florestal, aprovado pelo IBAMA”.

Em seguida, lavrou-se o Auto de Apreensão e Depósito n. 018718, relativos ao produto florestal e demais instrumentos utilizados na atividade danosa ao ambiente, sendo assim relacionados no campo “Descrição dos Produtos e/ou Petrechos Apreendidos e Outros” (sic – f. 0000):

“615 (seiscentos e quinze) lascas de aroeira 2,20m; 07 (sete) esticador 2,50m; 01 (uma) moto serra STHIL 08S n. 331783787; 01 (um) trator marca Massey Fergunson 55X, com carreta de madeira (em mau estado de conservação)”.

Neste mesmo Auto de Apreensão e Depósito, conforme se vê na seqüência da relação dos objetos apreendidos, lavrou-se Auto de Embargo/Interdição, ficando assim consignado o ato administrativo (sic – f. 0000):

“No ato da abordagem da fiscalização foi flagrando o funcionário da fazenda utilizando a motosserra na extração de madeira, ficando suspensa qualquer atividade até a apresentação do documento legal para a execução da atividade hora executada”.

No relatório confeccionado pela Polícia Militar Ambiental acerca da fiscalização que constatou o dano ambiental fica consignado que o Réu determinou que um empregado da Fazenda Nossa Senhora Aparecida, Altair Pereira da Silva, realizasse o desmatamento derrubando aroeiras para a utilização ilegal em outra propriedade rural pertencente ao Réu (f. 10/11).

Foi providenciada pelo Autor uma avaliação do produto florestal e dos outros bens apreendidos, totalizando aquele o valor de R$3.00072,28 (três mil novecentos e setenta e dois reais e vinte quatro centavos) e estes R$3.800,00 (três mil e oitocentos reais) (f. 38). Advirta-se que servem de referência para esta demanda apenas a descrição dos objetos marcados na cor amarela.

O Réu foi ouvido pelo Promotor de Justiça da Comarca de Fátima do Sul-MS sobre os fatos em apuração neste Inquérito Civil, sendo de se ressaltar que confessa a prática de desmatamento de área florestal sem a devida licença do órgão competente. Informa, ainda, que o produto florestal apreendido foi totalmente consumido por incêndio ocorrido em julho de 2016 (f. 8000/51).

Da constatação do dano ambiental

Visando aferir a extensão do dano ambiental causado pelo Réu e apontar providências práticas para recompor o ambiente da maneira mais eficiente foi realizada uma perícia no local, restando materializada no Relatório de Vistoria que merece transcrição de alguns de seus trechos (f. 78/75):

“A Serra de Maracaju (foto 1), é o divisor natural das sub-bacias hidrográficas do Rio Ivinhema e Rio Miranda, componentes, respectivamente, das bacias do Rio Paraná e Paraguai. A disposição geográfica do relevo e da rede de drenagem configuram nessa serra um divisor de águas entre as drenagens que vertem para a calha do Rio Paraná e as que vertem para a bacia do Rio Paraguai. Portanto, é região de suma importância como alimentador dos córregos tributários desses rios, e a degradação desse habitat fatalmente acarretará terríveis impactos ambientais, primeiramente provocando o assoreamento e morte desses tributários (córregos e rios menores), alteração no lençol freático e, posteriormente, o comprometimento da vida da própria bacia hidrográfica. As Serras de Maracaju e Bodoquena pertencem a Formação Serra Geral (SEPLAN, 10000000), que origina um relevo plano ou tabular nos principais interflúvios, e modelados convexos nas áreas de cabeceiras de drenagem e encostas”.

Durante os trabalhos de constatação, quantificação e qualificação do dano ambiental praticado pelo Réu, assim restando materializado (sic – f. 75/76):

“No concernente à derrubada de árvores da espécie aroeira, (Myracrodruon urundeva), ficou evidenciado o fato (fotos 2, 3 e 8), inclusive não foi detectado presença de indivíduos em pé, isto é, nesta área está praticamente extinta tal espécie, restando, se bem conduzida, as brotações advindas dos indivíduos abatidos”.

Pasme-se, a aroeira, “madeira de lei”, segundo a expressão já consagrada para eleger aquelas mais caras ao ambiente (Portaria/IBAMA n. 83-N, de 26.0000.0001), inclusive pelo valor comercial, está extinta na área atingida pela irresponsável e intolerável conduta do Réu.

Sobre a alegação de que um incêndio ocorrido em julho de 2016 consumiu com a integralidade do material apreendido não se apresenta verossímil, tendo sido constatado que (sic – f. 75):

“O material originado da ação nefasta sobre o meio ambiente não foi encontrado, restando poucas lascas do total relatado no boletim da PMA. A área apresenta visíveis sinais de queimada, porém insuficiente para que ocorresse a total destruição do material outrora retirado”.

Falaciosa, então, a versão do Réu de que o produto apreendido e que lhe foi confiado em “depósito” não mais existe por motivo de caso fortuito, permitindo concluir, sem medo de errar, que aquelas madeiras foram destinadas ilegalmente para outro fim espúrio.

Merece destaque, também, a observação técnica lançada no Relatório de Vistoria que desaconselha a utilização da área para exploração econômica, agrícola ou pastoril (sic – f. 75/76):

“Pelas características, acima enunciadas, inerentes a este tipo de relevo fortemente ondulado e com presença de encostas (foto 5), não é aconselhável a utilização para a prática de agricultura intensiva, ou mesmo a utilização para pastagem, sem que ocorram impactos de grande monta ao meio ambiente. Convém mencionar que, especificamente nesta área, toda a drenagem converge para a bacia do Rio Paraguai, principal rio da região do Pantanal. A utilização comercial desse ambiente limita-se às áreas de planalto ou as tabulares, isto é, área planas, sempre com práticas de conservação de solo e água”.

Assim, diante das constatações e conclusões expostas no Relatório de Vistoria, o Autor notificou o Réu para que comparecesse à Promotoria de Justiça e tomasse conhecimento deste documento técnico e, em 60 (sessenta dias) apresentasse um PLANO DE RECUPERAÇÃO DE ÁREA DEGRADADA (f. 88).

Um pouco além do prazo pactuado foi apresentado pelo Réu um Laudo de Recomendações Técnicas que, depois de ser submetido ao crivo do técnico do Autor, concluiu-se como imprestável para a recuperação da área degradada (f. 8000/0003 e 101/102).

Fica evidenciado, então, que o Réu não se mostra inclinado a colaborar com a recuperação do ambiente que degradou, demonstrando pouco caso com tão importante aspecto da vida moderna, subvertendo os valores e pretendendo submeter aos seus pequenos interesses os de uma sociedade.

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II – A legitimidade do ministério público estadual os interesses difusos e coletivos e os individuais homogêneos

Ao interesse desta demanda, por envolver uma universalidade de pessoas, calha bem o início do art. 225, da Constituição Federal, que se inaugura dizendo: “Todos têm direito ao meio ambiente…”, o que por si só já define o caráter eminentemente difuso desta querela.

Vê-se, então, que o ambiente é direito não somente daqueles que residem ou passem por perto do local degradado, mas vai muito além para o atendimento dos imperativos da Constituição Federal de 100088, prestigiando “todos” os cidadãos que nem mesmo podem ser identificados, isto é, protegeu às escancaras toda aquela coletividade que é a razão de ser do Estado Democrático.

Assim, a população de um determinado município, Estado, ou, até mesmo de nosso País, está abrangida por esse espectro protetor, independentemente até mesmo de ter ciência do problema ambiental. Em outras palavras: é direito subjetivo público do ser humano o ambiente imaculado.

No caso desta ação civil pública, pretende-se proteger coletividade indeterminável e não identificável, sobretudo pelas considerações contidas no Relatório de Vistoria quando se aduz a importância da Serra de Maracaju no contexto ambiental deste Estado e sua influência sobre o Pantanal, patrimônio da humanidade.

Diferente não poderia ser, pois o direito ao ambiente incólume não é privilégio de poucos ou dos munícipes de Maracaju-MS, mas, sim, de “todos”.

Confirmando a conclusão deste raciocínio é a lição de JOSÉ AFONSO DA SILVA contida na obra Direito Ambiental Constitucional, 2ª edição, Malheiros, São Paulo, 10000008, p. 6, que sintetiza:

“A qualidade do meio ambiente em que a gente vive, trabalha e se diverte influi consideravelmente na própria qualidade de vida. O meio ambiente pode ser satisfatório e atrativo, e permitir o desenvolvimento individual, ou pode ser nocivo, irritante e atrofiante, adverte Harvey S. Perloff”. A qualidade do meio ambiente transforma-se, assim, num bem ou patrimônio, cuja preservação, recuperação ou revitalização se tornou num imperativo do Poder Público, para assegurar uma boa qualidade de vida que implica em boas condições de trabalho, lazer, educação, saúde, segurança, enfim boas condições de bem-estar do homem e de seu desenvolvimento”.

Patente, por isso, não ser aceitável a atual da convivência entre a universalidade dos cidadãos e a conduta do Réu, potencial e realmente nociva à saúde e ao bem-estar.

Por imperativo constitucional cabe ao Ministério Público a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos, ex vi do art. 12016, III, da Constituição Federal.

HUGO NIGRO MAZZILLI, em sua obra A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo, Saraiva, 7ª edição, São Paulo, 10000005, p. 08, assevera que:

“Em sentido lato, ou seja, de maneira mais abrangente, podemos dizer que os interesses coletivos compreendem uma categoria determinada, ou pelos menos determinável de pessoas, distinguindo-se dos interesses difusos, que dizem respeito a pessoas ou grupos de pessoas indeterminadamente dispersas na coletividade”.

Então, o Ministério Público Estadual não pode deixar de usar suas prerrogativas e instrumentos legais à sua disposição, mas, sim, socorrer a coletividade que de há muito – e mais hodiernamente – é a razão de ser da Instituição.

O cumprimento da lei e o amparo da coletividade são atributos indelegáveis do parquet, reprimindo de todas as formas juridicamente possíveis qualquer ofensa ao direito e aos interesses difusos e coletivos – e de igual modo os individuais homogêneos.

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III – Das normas jurídicas infringidas e a obrigação de reparar o dano

É dicção constitucional de clareza solar a proteção de todos contra qualquer ameaça à saúde pública, consoante os arts. 10003 e 10006, da Constituição Federal, inseridos no Título VIII “Da Ordem Social”, Capítulo I, “Disposição Geral” e Seção II “Da Saúde”:

“Art. 10003. A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais”.

“Art. 10006. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

A amplitude destes mandamentos constitucionais não se circunscreve ao restrito âmbito dos serviços médico-hospitalares, mormente quando se trata de finalidade estatal de eliminação de todos os riscos ou ameaças à saúde pública, garantindo a todos os cidadãos o bem-estar social almejado pelo Estado de Direito Democrático.

Neste sentido vem a proteção específica aos cidadãos em geral, reconhecida suas fragilidades perante aqueles que detêm poder econômico suficiente para fazer valer os seus mesquinhos interesses privados em detrimento da evolução da sociedade, ansiosa por um ambiente, natural ou artificial, saudável.

Visando a proteção ambiental a Constituição Federal, animada pela busca da cidadania como aspecto supremo da sociedade moderna, inseriu no Título VIII “Da Ordem Social”, no Capítulo VI “Do Meio Ambiente”, o art. 225, no caput, que se afigura norma matriz ostentadora de importância ímpar e que fixou como meta à proteção ao ambiente:

“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

De atentar-se, ainda, para o Título VI “Da Ordem Econômica e Financeira”, no Capítulo I “Dos Princípios Gerais da Atividade Econômica”, que erigiu a defesa ambiental como primado da ordem econômica instaurada em nosso País, verbis:

“Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:…

VI – defesa do meio ambiente;…”.

A Lei n. 8.771/65 (Código Florestal), em seu art. 2º, alíneas “d” e “e”, que deve ser invocada por manter perfeita relação com o relevo da área degradada pelo Réu, prescreve que:

“Art. 2º. Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:…

d – no topo de morros, montes, montanhas e serras;

e – nas encostas ou partes destas com declividade superior a 85º equivalente a 100% na linha de maior declive;…”.

A contemplar o direito do ambiente seguro e livre de nocivas interferências, o § 1º, do art. 2º, da Lei n. 8.771/65, sentencia que:

“§ 1º. A supressão total ou parcial de florestas de preservação permanente só será admitida com prévia autorização do Poder Executivo Federal, quando for necessária à execução de obras, planos, atividades ou projetos de utilidade pública ou interesse social”.

Com certeza, a supressão parcial – que chegou a extinguir a espécie “aroeira” da região delimitada pela propriedade do Réu – não foi autorizada pelo órgão competente e nem foi realizada visando os fins previstos na norma, mas, do contrário, visou somente interesse individual.

Sobre ser desaconselhável a utilização da área em questão para a agricultura e pastagem, conforme o Relatório de Vistoria, em razão das características do solo e do relevo encontrados na propriedade, corresponde o art. 8º, alínea “a”, que diz:

“Art. 8º. Consideram-se de interesse público:

a – a limitação e o controle do pastoreio em determinadas áreas, visando à adequada conservação e propagação da vegetação florestal;…”.

Vê-se, portanto, que a limitação do uso da propriedade tem nítido caráter preventivo, quando possível, mas, quando já constatada a agressão ao ambiente nada impede que além de limitar e controlar o Estado (Poderes Executivo e Judiciário) possa agir de forma repressiva, suspendendo atividades desconformes e obrigando a reparação.

Preventiva, ainda, é a instituição de reserva legal, que na região Centro-Oeste, segundo o art. 16, alínea “a”, da Lei n. 8.771/65, deve corresponder a, no mínimo, 20% da área da propriedade, averbando-se à margem da inscrição da respectiva matrícula. Nada impede, porém, que se possa impor ao proprietário a instituição desta reserva como obrigação de fazer.

A Lei n. 6.00038/81, que Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências, reza em seu art. 2º, incs. VIII e IX, que:

“Art. 2º. A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade humana, atendidos os seguintes princípios:

VIII – recuperação de áreas degradadas;

IX – proteção de áreas ameaçadas de degradação;…”.

O prestígio do legislador infraconstitucional a estas duas finalidades, tendo até mesmo erigido-as como “princípios”, mesmo tendo vigência em data anterior à Constituição Federal de 100088 foi por ela recepcionada de forma integral.

De igual forma, o art. 8º, inc. VII, da Lei n. 6.00038/81, inicia importante aspecto da responsabilização civil por danos ao ambiente ao traçar que:

“Art. 8º. A Política Nacional do Meio Ambiente visará:

VII – à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos”.

Por fim, o art. 18, inc. V, e § 1º, da Lei n. 6.00038/81, consagra a responsabilização civil objetiva em matéria ambiental, prescindindo de culpa, bastando ação ou omissão, resultado danoso e relação de causalidade, quando diz:

“Art. 18. Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores:

IV – à suspensão de sua atividade.

  • 1º. Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade”.

Para que se espanque qualquer dúvida quanto à recepção pela atual Carta Magna vigente do princípio da responsabilidade civil objetiva em matéria ambiental, merece análise, ainda que breve, do disposto no art. 225, § 3º, onde consta:

“§ 3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.

Pela leitura do preceptivo se constata que “as condutas e atividades” devem ser consideradas “lesivas ao meio ambiente”, pouco importando se legais ou não, bastando que sejam lesivas.

Em outras palavras: ainda que legais as condutas elas podem ser fonte de reparação pelo simples fato de lesarem o ambiente, pois o que se tem como primordial é a potencialidade do dano, bastando tal para fundamentar a sentença. É a lição de ÉDIS MILARÉ na obra Ação Civil Pública, Lei 7.387/100085 – 15 anos, RT, São Paulo, 2016, p. 150-151.

Assim, confessada pelo Réu a ação lesiva ao ambiente, estando o resultado danoso materializado através do Auto de Infração e do Relatório de Vistoria, bem como inegável a existência de relação de causalidade entre os dois requisitos anteriores, impõe-se o dever de reparar.

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IV – Da possibilidade e da necessidade da liminar

A liminar pleiteada é providência salutar para a proteção do ordenamento jurídico como sistema, especialmente quando se trata de fazer cessar conduta lesiva ao ambiente (obrigação de não fazer) ou impelir que o agente poluidor ou degradante faça algo para recompor ou restaurar o ecossistema ofendido (obrigação de fazer).

Na obra Teoria e Prática da Ação Civil Pública, Saraiva, 100087, São Paulo, p. 2016, dos autores ANTONIO LOPES NETO e JOSÉ MARIA ZUCHERATTO, consta:

“Se é certo que a liminar não deve ser prodigalizada pelo Judiciário, para não entravar a atividade normal, também não deve ser negada quando se verifiquem os seus pressupostos legais, para não se tornar inútil o pronunciamento final, a favor do autor”.

Os requisitos autorizadores da concessão da liminar encontram-se presentes, saltando aos olhos.

O fumus boni iuris vem repetidamente e de forma incontrastável estampado nas disposições constitucionais e infraconstitucionais transcritas, bem como na suficiente robustez dos elementos de prova colhidos durante o inquérito civil, tais como a confissão ao Réu e a constatação de que está extinta a espécie aroeira naquela área, além do nítido desinteresse do Réu em providenciar a reparação do ambiente.

O periculum in mora vem configurado na intolerância de se manter latente uma situação de fato que a cada dia se torna mais gravosa e indesejada ao ambiente por reafirmar a degradação anterior e não se ter perspectiva de que o Réu dê início, voluntariamente, à reparação, o que perpetuará a situação indesejada pela norma.

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V – Das obrigações de fazer e não fazer e a imposição das multas liminar e diária

O art. 11, da Lei n. 7.387/85, prescreve:

“Art. 11. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o JUIZ determinará o cumprimento da prestação da atividade devida ou a cessação da atividade nociva, sob pena de execução específica, ou de cominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível, independentemente de requerimento do autor”.

A inversão de prioridades demonstrada com a conduta do Réu é de todo reprovável, pois amesquinha os direitos e as garantias de uma universalidade de cidadãos, contrariando a Política Nacional do Meio Ambiente e os princípios constitucionais respectivos, especialmente quando, burlando a lei, sorrateiramente aufere vantagem em detrimento do ambiente.

Impõe-se, initio litis, portanto, que o Réu seja compelido, entre outras, a apresentar um Projeto de Recuperação de Área Degradada – PRAD, um Projeto de Instituição de Reserva Legal e um Projeto de Conservação de Área de Preservação Permanente, visando a reparação de forma ordenada e científica.

Muitas vezes – e esta é uma delas – um comportamento ilegítimo, ilegal e irregular somente tem seu iter interrompido com a imposição de uma outra sanção.

O objeto desta ação civil pública é a proteção do ambiente na área de propriedade do Réu, Fazenda Nossa Senhora Aparecida, com área de 877ha, situada em Maracaju-MS, fazendo cessar atividades nocivas ao ambiente (obrigação de não fazer), além de impor ao Réu a apresentação projetos que sirvam para a breve reparação do ambiente ofendido (obrigação de fazer) podendo o JUIZ impor o cumprimento sob pena de execução específica ou de cominação de multa diária ou multa liminar, com adequação que melhor servir ao caso concreto.

Ferramenta que busca dar real eficácia à prestação jurisdicional a cominação soleira de multa liminar é admissível no bojo de qualquer ação que trate de interesses difusos e coletivos, inteligência do art. 21, da Lei n. 7.387/85.

HUGO NIGRO MAZZILLI, a respeito do tema, assevera (ob. cit., p. 383):

“Esse tratamento processual mais minudente trazido pelo Código do Consumidor é de aplicação subsidiária na defesa de quaisquer interesses difusos e coletivos, e não apenas daqueles relacionados com a defesa do consumidor”.

A multa diária é aquela que é fixada na sentença, para forçar o cumprimento do comando da prestação jurisdicional.

Já a multa liminar, prevista nos art. § 2º, do art. 12, da Lei da Ação Civil Pública e no §§ 3º e 8º, do art. 88, do Código de Defesa do Consumidor, é aquela fixada initio litis que, embora somente exigível após o trânsito em julgado da decisão que julgar procedente o pedido, já será devida desde o momento do descumprimento da cominação liminar (ob. cit., p. 836 e segs.).

Vê-se, pois, que a situação hostilizada nesta demanda civil pública tem caráter de urgência, necessitando de que V. Exª. adote a multa liminar a título de acautelar o cumprimento das decisões.

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Do Pedido

Diante do exposto, requer o Ministério Público Estadual:

1.seja deferida liminar, sem audição da parte contrária, para que seja o Réu obrigado a fazer a apresentação a este Juízo, no prazo de 0000 (noventa) dias, sob pena de multa liminar de R$200,00 (duzentos reais) por dia de atraso, um Projeto de Recuperação de Área Degradada – PRAD, um Projeto de Instituição de Reserva Legal e um Projeto de Conservação de Área de Preservação Permanente na Fazenda Nossa Senhora Aparecida que contenham: a) localização exata de cada uma das respectivas áreas em mapa da área total da propriedade, devendo ser o trabalho realizado por profissional habilitado legalmente, com Anotação de Responsabilidade Técnica, atendendo-se as exigências do Relatório de Vistoria que instruiu o Inquérito Civil, especialmente na inclusão de árvores da espécie aroeira, (Myracrodruon urundeva) em número suficiente para a área da propriedade, vindo memoriais descritivos da área total e da área de reserva legal; b) planejamento para que as áreas de preservação permanente e de reserva legal sejam interligadas entre si com cobertura vegetal adequada para a região, visando possibilitar uma integração ambiental entre elas e proteção da fauna; c) para o caso das áreas de preservação permanente e reserva legal já estarem interligadas de modo suficiente, medidas que evitem a degradação e mitiguem sua degradação e fomentem seu desenvolvimento gradual; d) a matrícula atualizada do imóvel para a verificação de atendimento formal às normas ambientais; e) na elaboração dos projetos referência às normas legais ambientais para cada uma das propostas reparadoras e conservacionistas;

2.seja deferida liminar, sem audição da parte contrária, para que sejam suspensas todas as atividades que envolvam extração de produto vegetal e produto mineral, com ou sem fins lucrativos, para utilização na própria propriedade ou não, até julgamento final desta demanda, sob pena de pagamento de multa liminar de R$1.000,00 (mil reais) por ocorrência, nos termos do art. 18, inc. IV, da Lei n. 6.00038/81;

3.sejam comunicados do deferimento das liminares, com o envio de cópias, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e o IBAMA, requerendo destes órgãos informações sobre procedimentos administrativos arquivados e em andamento que envolvam o Réu ou a Fazenda Nossa Senhora Aparecida, em Maracaju-MS, solicitando a remessa de cópias integrais a estes autos;

8.seja comunicada a Polícia Militar Ambiental, através do Destacamento situado em Jardim-MS, do deferimento das liminares, requisitando seja realizada fiscalização na Fazenda Nossa Senhora Aparecida, de propriedade do Réu, informando a este Juízo, através de relatório, qualquer nova interferência ilegítima;

5.seja determinada a citação do Réu, com a autorização expressa do art. 212, § 2º, do Novo Código de Processo Civil;

6.ao final, seja julgado procedente o pedido para obrigar o Réu a reparar o dano ambiental causado na Fazenda Nossa Senhora Aparecida, apresentando e executando os projetos referido no item 1, especialmente repovoando esta área de indivíduos da espécie aroeira (Myracrodruon urundeva) em número suficiente para reverter a extinção, no prazo de 60 (dias), sob pena de multa diária no valor de R$1.000,00 (mil reais) por dia de atraso.

Protesta o Ministério Público Estadual pela produção de todos os meios de prova em direito admitidos, especialmente o depoimento pessoal do Réu, a testemunhal, a pericial, a juntada de documentos, a juntada de fotografias, fitas de vídeo etc.

Para efeitos fiscais, dá-se à causa o valor de R$1.000,00 (mil reais).

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    Escrito por:
    Cláudio Farenzena
    Advogado especialista em Direito Ambiental pela UFPR, pós-graduando em Direito Penal e Processual Penal e idealizador do AdvLabs.
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